Hoje ainda pensava nas baboseiras que o Paulo me disse tantos anos atrás. Eu ouvia em silêncio, como nem mais consigo fazer cheia de mim e de achar que sei de tudo, eu o ouvia calada. Admirada de sua capacidade de filosofar de refletir.
“Esse dia que se foi nunca vai voltar...”
E eu achando que entendia e perdida, menina demais, por trás dos meus olhos brilhantes do pôr-do-sol.
Naquele tempo eu fazia música e a música me fazia, fluía dos meus braços, do meu corpo, da minha voz, hoje calada, colada pela falta do uso.
Naquele tempo toda baboseira virava poesia. E as palavras me definiam.
Depois fiquei “racional” demais pra poetizar, pra entender o abstrato, pra entender o que seria ouvir a voz do coração.
Hoje sou tão real que não crio mais histórias, tudo que escrevo é “Biografia de uma desconhecida”.
Uma vez entendida assim, tenho a ilusão de que poderei voltar a escrever, usando a imaginação. Ouvindo a voz do meu coração...
Talvez agora eu possa!
Hoje eu sou uma pessoa muito melhor, mais real, mais humana, feliz e ridícula. Hoje sou ninguém.
Talvez hoje a música passe pelos meus braços e saia como uma música da Ivete, que eu nunca gostei, mas que atravessa as pessoas com uma energia boa.
Talvez as próximas poesias nos meus lábios não sejam pra fazer chorar, nem pra contagiar com sofrimento. Talvez as próximas histórias tenham um final feliz.
Talvez essa música aprisionada atrás do espelho seja mais eu, do que as que fiz, com um sentimento que hoje rejeito, embora eu saiba que minha rejeição não o fará partir. E quando eu finalmente cantar ela soará como meu cheiro, e o tom tenha a leveza que carrego hoje e a melodia fale com o movimento que hoje têm as minhas mãos, o sorriso que não é um esforço e traz nos meus olhos semicerrados.
Talvez essa música possa sair sem me estrangular a garganta com choro incontido. Nesse dia minhas mãos não irão tremer.
Espero esse dia, com os olhos secos.
Até que ele chegue.
P.S: Casting Crows #2