sábado, 3 de outubro de 2009

O carro no Telhado

Atendendo a pedidos...

E, bem pra inaugurar meus escritos de Outubro, tenho um sonho desses. De novo, como naquele em que estávamos na antiga casa do meu avô, sei que você está lá, na sala de televisão dessa vez, mas não te vejo. Não vou lá me encontrar com você. Mas fico tentando limpar tudo, arrumar tudo, para que meu hóspede queira ficar, tenha uma boa impressão de mim, de nós. Fico andando como uma louca de um lado para o outro, assombrada pela presente ausência de um ou mais, que já se foram.

Pior é acordar ansiosa, com essa saudade e como estivesse prestes a matá-la, como se fosse vê-lo sair da cozinha com uma caneca de café e um sorriso.

Tanto tempo... E ainda não fui capaz de assimilar que você se foi para sempre, que me iludo em pensar que eu talvez possa ter mais uma, só mais uma de nossas conversas inteligentes, com todas as mudanças que eram capazes de operar em mim. Que não me deixou de herança sequer uma frase escrita para que eu pudesse me suportar. Nada para me dizer de novo e de novo o quanto admira minha paixão pela vida, só pra que eu não pense em morrer. Pra eu nunca mais tratar a morte com frivolidade, diante de sua dor e indignação. Pra que eu não tenha preconceitos ou faça distinções de gênero e sexo, só porque você percebe que eu o faço mesmo sem saber que havia outra forma de ver a vida.

O Alexandre fecha os olhos e tira o carro do telhado escorregadio por mim. E eu fico desejando que você volte, apareça me olhando por cima dos óculos, só para você ver que hoje sou tudo que você me ensinou ser e que, talvez, hoje eu mereça sua admiração como você mereceu a minha.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Edição de Outubro

Corre, corre, corre.

O vento balança as árvores verdes, fazendo surgir do céu uma cascata de folhas e flores amarelas, rosas, roxas, laranjas, brancas, vermelhas.


Você não adora Brasília na primavera?


As estações se atropelam, indecisas

Choveu, fez frio e os dias cinza fazendo as tardes parecerem madrugada por algumas semanas.

Ficou seco e frio,

Depois seco e quente,

Depois tão quente que choveu.

Ainda não sei se uma estação foi eleita até o fim dela

Ou se o calor poeirento de Samambaia será novamente substituído por dias frios e secos, ou secos e quentes ou se vai ficar tão quente que choverá no fim da tarde até a manhã do outro dia. Se novos dias cinza virão, ainda antes de chegar o verão.


E paro alguns segundos, enquanto me policio para não estressar com o transito, nem enterrar minha cabeça entre os ombros, paro para captar todo esse movimento. A dança da folhagem caindo lenta na ventania, indo longe, as paisagens de nuvens que só duram alguns minutos, imitando uma onda do mar lavando a praia, sob o sol. Estas cores, cheiros, sons de Brasília entrando em Outubro.

E, como se eu nem me lembrasse dele, ele chegou de mansinho pra me encontrar correndo e sem tempo de interromper a correria, para descansar num paraíso de palavras.


Corro, corro, corro.

Atropelando a mim mesma, no processo de chegar em mim.

Muitos esquemas de reforçamento, pra que eu seja capaz de discriminar.

Muita vida, pra que eu tenha tempo de escrever.


Só viver, só viver.

A vida não pára no ponto pra embarcar, vamos todos pendurados nas laterais, agarrando como for possível.

Corro, corro, meu corpo. Morro.

Tão cansada e ainda tanto a fazer.

A ponta dos dedos escorregando do pára-lama.

Corro, corro, canso!

Pra, tão satisfeita comigo, fechar-me para assistir ao espetáculo da dança das palavras por trás das pálpebras, mas sem tempo para dar à luz os textos, as músicas, a arte.

Ficam só pra mim, egoísta.

Me desvendando, explorando, descobrindo. E me conheço melhor, seduzida por elas, dançando no ritmo delas, criando e executando em tempo real, concomitantemente.

Gosto de mim assim. Gosto do que fiz de mim.

E vivo, de novo, intensamente cada segundo.

Aprendendo e reaprendendo a amar, a me amar, a desfrutar da existência

De tudo


Sorrio, marota, pra esse Outubro ainda tão jovem. Nem sei se pronta pra ele, mas sem dúvida pronta pra olhar para trás, rindo, quando ele passar. Se um bom Outubro, só mais alguns dos bons dias em que colho do que planto. E, se for dor, para vê-la depois ao longe, como um pedaço, um detalhe, uma pincelada, da obra de arte que fiz do que foi feito de mim.